Explicando quatro mitos sobre assédio sexual para o Direito do Trabalho

Apesar de ser um tema muito debatido e cada vez mais esclarecido pelos veículos de informação, alguns aspectos importantes quanto ao assédio sexual sob o ponto de vista jurídico trabalhista ainda são mal compreendidos.

Assim, é necessário se esclarecer alguns conceitos básicos sobre esta questão tão importante para empregados e empregadores.

1.º MITO: A CONFIGURAÇÃO DO ASSÉDIO SEXUAL NO TRABALHO EXIGE EMPREGO DE VIOLÊNCIA.

A Desembargadora Ivete Ribeiro, do Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região, explica que “o assédio sexual no trabalho se caracteriza por comportamento ou revelação, por palavras, gestos ou ações, de natureza sexual, não pretendido pela pessoa que se destina e que o reputa ofensivo, criando uma barreira ao desenvolvimento sadio do ambiente de trabalho”.

Em esfera trabalhista, admite-se dois tipos de assédio sexual, nenhum dos quais exige o emprego de violência para que se configure. São eles:

  • Assédio sexual por chantagem: uso ilegítimo do poder hierárquico para exigir prestações de “favores sexuais”, sob a ameaça de algum prejuízo ou promessa de algum benefício. É prática ilegal independente da recusa da vítima.
  • Assédio sexual por intimidação: incitações, solicitações ou manifestações de índole sexual, verbais ou físicas, não desejadas pela vítima, de forma a criar uma situação ofensiva ou hostil, prejudicando o ambiente de trabalho.

Como se vê, não se requer, para caracterização do assédio sexual, a presença de qualquer conduta violenta pelo agente. Tanto é assim que muitas vezes este acredita estar elogiando ou agradando a vítima. Isso, porém, não altera a configuração do fato aos olhos do Direito do Trabalho.

2.º MITO: APENAS AS MULHERES PODEM SER VÍTIMAS DE ASSÉDIO SEXUAL.

Alguns creem que apenas mulheres podem sofrer assédio sexual no trabalho. No entanto, atualmente é pacífico que qualquer pessoa pode ser vítima de assédio sexual, independentemente de seu gênero ou qualquer outra condição pessoal. Da mesma forma, qualquer pessoa pode ser um assediador ou uma assediadora, não havendo nenhuma limitação quanto a isto.

A crença equivocada de que o assédio sexual vitima apenas mulheres, porém, possui raízes profundas.

Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelam que 52% (cinquenta e dois por cento) das mulheres economicamente ativas já foram assediadas sexualmente, o que denota tratar-se de realidade muito comum entre as trabalhadoras.

Além disso, as profissões que apresentam maior exposição ao assédio sexual são desempenhadas primordialmente por mulheres. Sônia Mascaro Nascimento, autora dos livros “Assédio Sexual” e “Trabalho da Mulher: das proibições para o direito promocional”, aponta que empregadas domésticas e secretárias tendem a sofrer mais este tipo de assédio, pois em geral exercem suas atividades de maneira mais solitária e em ambientes mais privados.

Outro fator que pode ter contribuído com a acepção de que apenas mulheres podem ser assediadas sexualmente é o fato de que até muito recentemente a lei penal definia que apenas mulheres poderiam ser estupradas, o que se alterou somente com o advento da Lei nº 12.015, de 2009.

3.º MITO: O ASSÉDIO SEXUAL, PARA FINS TRABALHISTAS, SÓ EXISTE QUANDO HÁ HIERARQUIA ENTRE O ASSEDIADOR E O ASSEDIADO.

A afirmação de que, para fins trabalhistas, o assédio sexual só se configura quando ocorre de forma vertical ascendente, ou seja, quando a vítima é assediada por seu chefe, não é verdadeira.

Tanto a doutrina quanto a jurisprudência admitem que o assédio sexual, para fins trabalhistas, pode ser vertical ascendente (de chefe para subordinado), vertical descendente (de subordinado para chefe), horizontal (quando não há hierarquia entre assediado e assediador), ou mesmo coletivo (quando há múltiplos assediadores e/ou múltiplas vítimas).

Tal exigência se aplica apenas para configuração do crime de assédio sexual, tipificado art. 216-A do Código Penal, pois nele é necessário que o agente se prevaleça de “sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.

Ou seja, penalmente, é necessário que a vítima seja subordinada ao assediador ou assediadora, mas isso não se reflete em esfera trabalhista.

4.º MITO: ASSÉDIO SEXUAL, SOB O ASPECTO TRABALHISTA, SEMPRE CONFIGURA CRIME.

A configuração do crime de assédio sexual não se confunde com o instituto de mesmo nome em campo trabalhista. Isto quer dizer que alguém que tenha praticado assédio sexual contra um colega de trabalho, reconhecido por Juiz do Trabalho, pode não ser condenado ou mesmo processado criminalmente por este fato.

Como já visto, o crime de assédio sexual, tipificado no art. 216-A do Código Penal, exige características nem sempre exigidas em campo trabalhista.

Isso não quer dizer, porém, que uma conduta tida como de assédio sexual para fins trabalhistas não possa configurar outros crimes que não aquele de mesmo nome, previsto no art. 216-A do Código Penal. A depender da situação, pode-se estar diante, por exemplo, dos crimes de constrangimento ilegal (art. 146 do Código Penal), de ameaça (art. 147 do mesmo diploma), ou mesmo de estupro (art. 213 da referida lei penal). Também é possível que a conduta em questão não se configure como crime algum (conduta atípica).

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